Inteligência Artificial promete otimizar governança das instituições

Setor que busca unir valores e decisões ágeis procura soluções tecnológicas para liberar equipes para atividades estratégicas

Como unir dois pontos que, inicialmente, parecem tão contraditórios? Tecnologia e humanização. Automação e personalização. Dados e valores. Esses são alguns dos dilemas que entram em jogo quando se analisa o uso da Inteligência Artificial no meio corporativo. E isso se torna ainda mais relevante quando essa questão é discutida justamente na área de governança, que tem como objetivo debater valores, ética e princípios humanos nas tomadas de decisões. 

À medida que esse debate cresce, surgem iniciativas para lidar com esses desafios. Há cinco anos, uma ferramenta tem sido aprimorada e utilizada no Grupo Marista, que reúne instituições nas áreas de saúde e educação, com o intuito de reduzir riscos e tornar as questões de auditoria mais simplificadas e assertivas. Criado dentro do próprio grupo, o Hercules foi projetado inicialmente como um robô e hoje é uma plataforma que atua de forma preventiva, conectando-se a bancos de dados internos e externos, como o Portal da Transparência e a Receita Federal, para cruzar informações que auxiliam nas tomadas de decisões internas da instituição. “A estrutura de governança tradicional, com a qual o mercado predominantemente trabalha, precisa se modernizar. É uma abordagem mais reativa, ou seja, assim que uma adversidade ou risco potencial é detectado, é realizada uma auditoria. Nestes casos, são utilizadas bases amostrais que podem identificar problemas e a partir delas, traçar planos de ação, muitas vezes pouco efetivos ou mensuráveis, o que torna tudo limitado. Com o Hercules, nos antecipamos. Através do cruzamento de dados, nossa auditoria é contínua, o que nos permite mensurar melhor os riscos, identificar novos, apoiar regras de negócios mais efetivas e várias outras formas de agregar valor ao negócio”, analisa o gerente de Auditoria Interna, Riscos e Compliance do Grupo Marista, Anderson da Silva Oliveira.

Menos burocracia interna

De acordo com Anderson, 100% das transações são analisadas de forma automática e os resultados são disponibilizados por meio de painéis de indicadores ou através da própria plataforma, que apoiam a elaboração de planos de ação com soluções de auditoria, tomadas de decisão em investigações corporativas e compliance, análises de conflito de interesse, entre outros. Ao todo, foram contabilizados 90 testes automáticos, em 12 processos diferentes de negócios, o que promoveu a economia de mais de duas mil horas que seriam gastas em testes manuais. Além disso, mais de 50 documentos normativos foram revisados e simplificados. “A ideia é adotar, ainda em 2023, uma ferramenta que facilite as buscas realizadas pelos nossos colaboradores, reduzindo a burocracia interna. O nosso grande desafio para os próximos anos dentro dessa área, será equilibrar o anseio da sociedade por mais agilidade sem perder controles de ética e compliance”, analisa o diretor da área, Renato Lara.

As automações da plataforma também se aplicam diretamente ao negócio, como por exemplo, na avaliação prévia de fornecedores da instituição. Anderson explica que na primeira etapa de avaliação, antes de qualquer negociação, a área de Suprimentos, através do Hercules, utiliza uma análise estruturada, que identifica qualquer vínculo, seja de pessoa física ou jurídica, às listas restritivas do governo. “Se algo for encontrado, a negociação nem se inicia, ou seja, é possível antecipar os riscos e evitar problemas futuros”, conta. Até o final de 2022, todos os fornecedores ativos foram monitorados diariamente nas listas restritivas governamentais, dez mil fornecedores e sócios foram analisados mensalmente em relação à (PEP), 400 mil documentos conferidos diariamente, 177 fornecedores indicados para análise individual e 1.027 consultas de background check (verificação de antecedentes) realizadas.

Anderson ainda comenta que a escolha de prestadores de serviços deve passar por procedimentos de avaliação e concorrência. Neste processo, precisam cumprir algumas exigências e a seleção do fornecedor,. “Neste caso, se o fornecedor externo escolhido tiver alguma ligação com algum colaborador ou Pessoa Politicamente Exposta (PEP), o Hercules sinaliza de forma proativa para que seja feita uma análise detalhada, verifique se os processos foram seguidos ou se há potencial conflito de interesse”, explica. 

A um passo da Inteligência Artificial

Com o objetivo de tornar a plataforma ainda mais eficiente, a área de Auditoria, Riscos e Compliance do Grupo Marista tem estudado a implementação de iniciativas que permitam a ativação da Inteligência Artificial no Hercules. A análise conta com o apoio de professores da Escola Politécnica da PUCPR atuando como consultores. Em 2019, foi realizado um projeto-piloto com o objetivo de otimizar e minimizar os custos da instituição, analisando os registros de ponto dos colaboradores. “A análise buscou padrões de registro de jornada de trabalho a fim de identificar padrões aceitáveis na jornada de rotina do colaborador. Caso houvesse registros fora do padrão, este comportamento era armazenado como outliers, ou seja, algo não previsto. Isso nos permitia associar quais colaboradores estavam tendo um comportamento parecido e tratar o problema, antes que ocorresse de fato. Sendo assim preditivo e evitando gastos, como horas extras ou outros problemas de legislação trabalhista, por exemplo”, relembra Anderson.

No entanto, o gerente afirma que a instituição tem o desejo de retomar o projeto anterior, através de um novo piloto, buscando desta vez olhar a jornada do colaborador e identificar qualquer problema, de uma forma mais ampla e não somente através dos registros de ponto, antes que ocorra uma perda de talento ou potencial passivo trabalhista. “Isso torna mais fácil estabelecer planos de ação preventivos e corrigir rotas. Estamos no caminho certo e trabalhando, principalmente, na evolução da qualidade dos dados para seguir com esse plano”, conclui. 

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